Definitivamente
viver não é fácil. Basta observar as fatalidades que poluem as estradas da
história. Milhões morreram sem conseguir aprimorar-se na difícil arte de
existir. A vida muitas vezes é áspera, arriscada e sempre perigosa. A toada
inclemente do tempo, a tensão de ter que conviver com pessoas impiedosas, o
peso de ter que decidir entre o certo e o errado exigem cuidados extremos. Não
basta viver -- é preciso viver bem e para isso é necessário concentração, bom
siso e uma pitada de humildade.
A
arte de viver requer que se rompam os confinamentos. Toda marginalização ou
reclusão imposta é nitroglicerina que detona a alma e forma abismos que sorvem
a alegria de viver. No ventre da história conturbada e triste do século 21,
somente artistas e poetas conseguiram recuperar o verbo coexistir de sua
insignificante função. Antigamente coexistir descrevia a tolerância como mero
dever. Os civilizados precisavam de resignação para aguentar o próximo. De repente,
coexistir passou a significar a beleza de reconhecer a dignidade dos que pensam
diferente, transmitindo a idéia de que ninguém será discriminado, diminuído ou
marginalizado por causa de sua fé, cor da pele ou ideologia política.
As
diferentes cosmovisões possuem valor idêntico. Na boca dos poetas, as
expectativas dos profetas por um mundo sem cadeias de absolutismo já começaram
a acontecer. Eles intuem que em breve a humanidade não suportará racismos,
ódios e desprezos sociais. Um dia, os campos de batalha serão arados e semeados
com amor para que nunca mais se confunda o choro de crianças com os hinos
marciais.
A
arte de viver requer que se ame a poesia. Só ela pode apagar o ódio. Os poetas
se unirão a homens e mulheres de boa vontade para soterrar os charcos da
maldade com benignidade e beleza. Estes serão chamados filhos de Deus, pois
carregam o antídoto capaz de salvar o mundo. Nervos gripados de vingança e
olhos enrubescidos de brutalidade se confrontarão com a singeleza da palavra,
mas a ternura triunfará -- quem tem ouvidos para ouvir, ouça.
A
arte de viver requer que sempre se opte pela simplicidade, porque a vida
verdadeira se esconde na realidade mais frágil. Os que se encantam com as
sofisticações não conseguem enxergar a beleza que mora nas coisas efêmeras; só
o insubstancial é eterno. É necessário um olhar singelo para perceber a graça
que há no comum. Os pobres de espírito entrarão nos átrios sagrados de Deus. Os
puros de coração perceberão na bruma silenciosa a voz do Espírito.
A
arte de viver requer integridade. Uma vida abundante precisa juntar os
fragmentos da alma para viver com uma santidade não restrita à obediência
religiosa ou ao cumprimento de mandamentos moralistas. Não basta resignar-se.
Santidade é plenitude do ser, do ser-homem, do ser-mulher. Só os
verdadeiramente santos eternizam os instantes para, inteiros, saborearem as
chances fugazes de felicidade.
A
arte de viver requer respeito aos ciclos da vida. As estações se alternam do
verão ao inverno, da primavera ao outono, e quem não experimenta cada tempo com
suas peculiaridades acaba adoecendo. No tempo de nascer faz-se festa, no de
morrer lamento; no tempo de plantar semeia-se esperança, no de colher o que foi
plantado lida-se com a derrota; no tempo de matar se aprende a dizer adeus, no
de sarar o poder do perdão; no tempo de demolir se despede da onipotência, no
de construir adquire-se fé na ressurreição; no tempo de chorar se convive com a
fraqueza, no de rir com a força da alegria; no tempo da guerra se percebe o
perigo da perversidade, no da paz a felicidade da sabedoria.
A
arte de viver requer sensibilidade transcendental. Contentar-se com os
horizontes do mundo material e imanente significa abrir mão da vida eterna. Os
seres humanos nasceram com sede pelo que está além do céu, além da última
galáxia, além do tempo Pulsa no coração humano a litania que repete: “Por que
te escondes, Senhor?”. Tudo passa. Todas as emoções perdem o encanto. Todos os
prazeres são provisórios, mas a sede pelo divino permanece. Quem beber de um
gole d’água da vida, quem receber uma visitação do Espírito e quem ouvir uma só
palavra do Cordeiro de Deus, jamais se contentará com o brilho deste mundo.
A
difícil arte de viver não aceita procrastinação. Quem deseja experimentar o céu
e evitar o inferno deve começar já, antes que se rompa o fio de prata.
Soli Deo Gloria.
Soli Deo Gloria.
Ricardo
Gondim
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